As dinâmicas complexas da comunicação geradas pela participação ativa da cidadania levam Botero (2006) a afirmar que essas interações facilitam «os mecanismos de participação visando o fortalecimento da democracia» (p. 23).
Uma democracia relacionada a um governo aberto, onde as segmentações dos públicos estabelecidas pelas organizações públicas para seu relacionamento têm como intenção a cooperação e o relacionamento com o cidadão.
Por essência, como expressa Botero (2006), a comunicação é de caráter público e «desde essa nova perspectiva, ela se identifica não apenas com a necessária consolidação de um novo ethos social, mas com a necessária democratização e apropriação social da ciência e da tecnologia, e isso é, precisamente, inovação social» (p. 38).
Isso é compreendido a partir de um interesse geral.
«O uso alternativo das tecnologias da informação na reconstrução da sociabilidade e da esfera pública passa, sem dúvida, por mudanças profundas nos mapas mentais, nos idiomas e nos designs de políticas, todos exigidos pelas novas formas de visibilidade que a Internet tece: um processo e percurso que introduz uma verdadeira explosão do discurso público ao mobilizar a mais heterogênea quantidade de comunidades, associações, tribos, que, ao mesmo tempo em que libertam as narrativas do político das múltiplas lógicas dos mundos de vida, despotencializam o centralismo burocrático da maioria das instituições, potencializando a criatividade social no design da participação cidadã» (Martín-Barbero, 2002, p. 13).
Essa criatividade social à qual Martín-Barbero se refere, em relação ao design de estratégias para a participação cidadã por parte das organizações públicas, debate com a afirmação de Amado (2015), que destaca a existência de uma ânsia dos governos em transmitir conteúdos em todas as telas possíveis, situação própria da multimídia, onde a estratégia é difundir o mesmo mensagem ao cidadão e que este apenas a receba, sem ter um feedback para medir o cumprimento dos objetivos.
«O termo ‘multimídia’ é usado corretamente quando, por exemplo, o lançamento de um filme resulta simultaneamente na venda de um videogame, na transmissão da série televisiva, em camisetas, brinquedos, etc. Neste caso, temos verdadeiramente uma ‘estratégia multimídia’. Mas se quisermos designar de maneira clara a convergência dos meios separados para a mesma rede digital integrada, deveríamos preferencialmente usar a palavra ‘unimídia’. O termo ‘multimídia’ tem o risco de induzir a erro, pois parece indicar uma variedade de suportes ou canais, quando a tendência de fundo tende pelo contrário à interconexão e à integração» (Lévy, 2007, p. 50).
«Contrariamente ao espírito transmídia, que permite a apropriação e ressignificação do conteúdo pelo usuário, a multimídia busca a redundância em múltiplos canais de uma mesma mensagem, na pretensão de que seja recebida com a maior fidelidade possível» (Amado, 2015, p. 76).
Por sua vez, uma mensagem racional que estabelece conexões entre os cidadãos e as instituições, caracterizadas pelas formas de participação na sociedade em rede de Castells (2001) e que, para Loizate (2015), se evidenciam a cada curtida, criação e distribuição (compartilhamento) nas redes sociais virtuais. Igualmente, com o alcance à cocriação e à viralização no atual ecossistema de mídia.
Castells (2001) estabelece três tipos de relação: a de produção, a de experiência e a de poder.
Tanto a cocriação quanto a viralização são fatores indispensáveis na transmedialidade. Loizate (2015) afirma que a cocriação e a colaboração são elementos que os cidadãos incorporaram no cotidiano para a criação de ambientes que promovam uma cultura participativa. Além disso, ele considera que:
Uma das características mais apreciadas das narrativas transmídia é sua horizontalidade, que permite um diálogo com os usuários, que geralmente se tornam uma comunidade entusiasta que produz conteúdos que complementam e enriquecem aquele usuário ou emissor institucional com o qual dialogam. (Amado, 2015, p. 172)
Assim, o diálogo e a participação fazem parte de um governo aberto sob uma perspectiva democrática. Dickson (2001), conforme apresentado por Galvis e Botero (2007) em sua publicação «Comunicação pública da ciência como fator de consolidação democrática», propõe modelos democráticos a partir da relação entre o Estado e a cidadania. Dois modelos em particular apontam para a comunicação transmídia: o modelo de diálogo e o modelo de empoderamento (modelo de participação cidadã).
O primeiro é «onde os cientistas são solicitados a ouvir e responder às preocupações do público» (p. 34), e o segundo, «onde os cidadãos podem participar das decisões públicas sobre a ciência» (p. 34).
«Neste último modelo, o público tem acesso a informações refinadas que ‘implicam uma consciência completa de como o conhecimento científico é produzido e aplicado, para que possa tomar ou apoiar decisões de maneira corretamente informada – não decisões baseadas nas descrições que aqueles formalmente responsáveis por tomá-las querem dar'» (Dickson, 2001). O modelo participativo estimula o conhecimento científico pelos «presumíveis» leigos, gera construção de democracia por meio da educação e participação cidadã e desfaz os estereótipos que conferem ao público um ar de ignorância e desinteresse (Galvis e Botero, 2007, p. 34).
É neste momento que o conceito de participação ativa na transmídia adquire sentido. Deixa de ser um «sujeito passivo, mas atuante; age como um stakeholder, capaz de deliberar e contradizer, pois está ciente de seu papel como público. Assim, na participação e na democracia participativa, é onde o cidadão é construído e formado» (Galvis e Botero, 2007, p. 34).
No entanto, Galvis e Botero (2007) também referenciam Lewenstein (2003), que formula a existência de quatro modelos de comunicação pública (deficitário, contextual, de expertise e de participação pública).
O quarto modelo está relacionado à comunicação transmídia, sendo o modelo de participação pública, o qual, conforme Galvis e Botero, é «de consenso, participação cidadã, deliberação e democratização…» (2007, p. 35).
É por meio dessa participação que os cidadãos se expressam em termos de controle e de observadores das políticas, buscando constantemente o bem comum. Isso é o que acontece ao projetar cenários de comunicação transmídia, conectando as plataformas estabelecidas na estratégia com os mecanismos narrativos e as emoções do público (Gallego, 2011).
«Os produtores de conteúdo e as audiências não devem se contentar com o desenvolvimento de uma narrativa passiva; o design de narrativas transmídia responde a um desafio de comunicação no qual os elementos envolvidos exploram e executam propostas que concorram em um mercado ávido por aplicações criativas e participativas que envolvam todos os sentidos» (Gallego, 2011, p. 22).
Por outro lado, a proposta do modelo de comunicação pública para divulgação social feita por Galvis e Botero (2007) também está relacionada à gestão da comunicação transmídia em um governo aberto, que «se concentra no modelo de participação de Dickson e no modelo mediador de ação social formulado pelo professor espanhol Manuel Martín Serrano» (p. 36).
O modelo de Martín-Serrano (2004) baseia-se na mediação como representação da prática social: «cumprir a função de integração é precisamente sua capacidade de estabelecer uma única e mesma lógica para a gestão de recursos, ações e objetivos» (Galvis e Botero, 2007, p. 36).
A comunicação transmídia é considerada por Gosciola (2016) como uma estratégia integral de comunicações, que deve ser pensada e tratada com a rigorosidade exigida pelo design de ambientes inovadores de caráter social, desde a criação de ferramentas e «dispositivos para promover a produção, disseminação e enriquecimento do mundo narrativo transmídia» (Scolari, 2014, p. 75).
A otimização dos recursos ocorre pelo aproveitamento da multiplicidade de plataformas existentes, para entregar as mensagens corretamente aos seus públicos. Isso faz com que a gestão da comunicação se consolide a partir da estratégia e seja constantemente ajustada para alcançar os resultados esperados (Amado, 2015).
No entanto, para Scolari (2014), a maioria dos casos transmídia analisados em seu texto «Narrativas transmídia: novas formas de comunicar na era digital», «não surge de um planejamento cuidadoso (transmídia estratégico), mas se apresenta como uma expansão narrativa ditada pelas condições favoráveis do ecossistema midiático» (p. 74). Um ecossistema caracterizado pela diversidade de plataformas e formatos, como explicado por Scolari através das hibridações, mutações, emergências e avaliação do ecossistema midiático, o que exige novas leituras e linguagens na construção de conteúdos, relacionamento e na própria estratégia.
«É importante ter em mente que as formas de apropriação cultural realizadas hoje envolvem maneiras diferentes de interagir com a informação, administrá-la, construí-la e articulá-la em sistemas de comunicação que, por sua vez, não dependem mais de um único canal de produção e distribuição, mas foram apropriados até mesmo pelos usuários como geradores de novos conteúdos» (Arredondo, Buitrago e Guzmán, 2015, p. 130).
Bencomo (2007) afirma que as organizações estão obrigadas pelas dinâmicas atuais a inovar, o que leva ao controle da mudança e às decisões oportunas. Ele adiciona que «se não houver capacidade de inovação, de reagir planejadamente às mudanças internas e externas, a organização perderá as oportunidades que se apresentam e se verá sujeita a uma mudança inevitável e sem rumo conhecido» (p. 165).
Levando isso em consideração, a gestão da comunicação transmídia deve seguir o modelo proposto por Galvis e Botero (2007), o qual foi referenciado anteriormente para tratar a participação ativa da cidadania na construção de narrativas infinitas.
No entanto, ao gerenciar o conjunto de elementos que integram a expansão das narrativas, é necessário estabelecer parâmetros, protocolos ou manuais ancorados em um modelo de colaboração que permita a construção coletiva de conhecimento.
Para Gallego (2011), a construção conjunta depende de um modelo derivado do conceito de inteligência coletiva cunhado por Lévy (2004): «a inteligência coletiva só começa com a cultura e aumenta com ela» (p. 21). No entanto, ele expressa que «não há um modelo único de criação de narrativas transmídia, embora haja concordância sobre seus requisitos essenciais: um mundo consolidado, uma história, personagens robustos e a seleção de plataformas condizentes com as características da produção» (p. 46). Além disso, ele acrescenta que cada plataforma é única, sendo semelhante a «um instrumento em uma sinfonia».
É importante mencionar que Gallego revisa os modelos aplicados na comunicação transmídia de Weiler, Ginn e Monellos:
Weiler (2010) descreve seu design a partir de seis ações:
- Tomar o tempo para avaliar a história que se deseja contar.
- Responder a si mesmo as perguntas difíceis: Esta é a forma certa de contar uma história? Por que as pessoas se interessarão?
- Apresentar seu ponto de vista. Caracterizar a narrativa com a implementação de pessoas e temas que reflitam sua própria identidade.
- Pensar em como mostrar, mais do que contar. Nem todos os elementos devem ser desenvolvidos de maneira explícita. O público deve ter espaço para gerar perguntas e investigar sobre seus resultados.
- Facilitar as condições para que as audiências se tornem colaboradores.
- Não permitir que as possibilidades de interação com a tecnologia sejam mais importantes do que o desenvolvimento da história.
Ginn (s.f) descreve seu processo da seguinte forma:
- Criar uma descrição do projeto, gerando uma estrutura robusta.
- Criar um mundo, narrativas, elementos para compartilhar, personagens e temas (representação de conflitos pessoais).
- Projetar e planejar mecanismos de engajamento e participação das audiências. Chamar à ação online e no mundo real.
- Especificar meios e tecnologias, incluindo jogos, dispositivos móveis e a rede.
- Preparar-se para os negócios, criando apresentações e pilotos, entendendo os direitos, deveres e licenças.
Monello (2010) define uma estrutura em cinco princípios:
- Projetar para experiências comunitárias. As audiências reagem melhor quando compartilham um espaço, uma história.
- Tornar os projetos tangíveis. É importante estabelecer conexões diretas com o mundo real, indo além dos limites impostos por um meio. Quando as pessoas têm algo em suas mãos, fazem perguntas sobre isso, compartilham informações e promovem a criação de comunidades.
- Motivar a descoberta. As pessoas devem encontrar a informação por si mesmas. Este mecanismo é o motor dos fãs que se apropriam, compartilham e redefinem uma narrativa.
- Tornar o design algo pessoal. Tentar vinculá-lo aos referentes culturais da comunidade em que se intervém.
- Criar um mundo maior do que seus personagens. Não se concentrar apenas em conflitos e seus protagonistas, mas na criação de guias de conexão que motivem um crescimento contínuo. (Gallego, 2011, p. 46)
A partir dessas estruturas, como expressa Mercedes (2013), é necessário mencionar que o planejamento estratégico da «transmídia precisa de um ajuste fino e cálculos, e nem todas as ações, suportes e plataformas transmídia são válidos» (p. 15).
Por sua vez, Loizate (2015) menciona a existência da intercriatividade ao destacar o aumento das atividades colaborativas na criação de «campanhas publicitárias baseadas em estratégias de storytelling transmídia. De fato, o storytelling transmídia é um processo colaborativo e intercriativo» (p. 42).
Nesse sentido, para qualquer tipo de gênero, o roteiro transmídia constitui um elemento complexo que deve preservar, ao longo da produção, flexibilidade suficiente para incorporar o trabalho expansivo das audiências, reunir e adicionar novos nodos narrativos, e permitir a interatividade (Lovato, 2015, p. 35).
Ao desenvolver uma estratégia, é necessário considerar três campos, conforme indicado por López (2015): o conteúdo, o processo e a saída, seguindo um diagrama de fluxo semelhante ao ciclo de qualidade: planejar, fazer, verificar e ajustar (PDCA). Isso está relacionado com a sequência proposta por Loizate (2015): a mensagem, a construção de manuais e a seleção adequada da plataforma midiática.
«Um projeto transmídia deve ser bem fundamentado e não partir do acaso. O uso de uma bíblia como documento mestre permite o controle de todas as situações que surgem em torno de uma história para monitorar as abrangências e possíveis desenvolvimentos futuros, além da expansão para várias equipes de profissionais» (Gallego, 2011, p. 62).
Os desenvolvedores de conteúdo transmídia precisam, segundo Gallego (2001), de «habilidades para projetar conteúdo em uma cultura de convergência». Irigaray (2014) afirma que quem produz esse tipo de conteúdo deve implementar o desenvolvimento «de estratégias multiplataforma que fortaleçam a ideia original realizada no suporte base, retroalimentando entre si os produtos e ações derivadas em um horizonte experiencial expandido que transforme as audiências e usuários em sujeitos prosumidores» (p. 119).
A grande quantidade de mídias envolvidas e suas diferentes etapas produtivas levantam questões sobre como organizar uma estrutura de trabalho eficiente. Da mesma forma, conclui-se que o planejamento deve ser detalhado para identificar os requisitos necessários para o design e produção de estratégias transmídia (Gallego, 2011).
«Em vez de se concentrar na implementação de múltiplas plataformas ou tentar gerar valor ao incorporar tecnologia, a iniciativa deve partir de uma mensagem clara e de um mundo suficientemente robusto para suportar várias histórias» (p. 62).
Por sua vez, Scolari (2014) opina que «as lógicas narrativas transmídia estão aqui para ficar. Diante da fragmentação das audiências, o transmídia storytelling oferece uma estratégia possível para reconstruir nichos de audiência ao redor de um mundo narrativo» (p. 78). Portanto, Irigaray (2014) considera que «não há transmídia sem estratégia participativa» (p. 14).
No entanto, cada «projeto transmídia deve ter uma estratégia de apresentação do mesmo, não apenas um planejamento de distribuição adequada utilizando os diferentes canais possíveis, mas também a definição da cadência de apresentação do conteúdo em cada um desses canais» (Bertolotti, 2011, p. 4).